Assomaram duas cabeças na chegada à bomba de gasolina quando já era de noite. Eram duas mulheres nos lugares da frente de um carro branco. O carro onde vinham, de onde vinham, e para onde iriam, e daí para onde continuariam a ir se deus quisesse e motor deixasse, esse carro era um ferro velho com nome de musa. Mas disso elas não deviam saber, disso da musa. Para elas era um Clio, era um Renô que se escrevia Renault, mas que não se lia Renault, lia-se Renô. Um carro francês e muito velho, que andava a ser comido pelo tempo há mais de vinte anos. Branco por fora, perfume e cigarros por dentro, era o que dava para ver deste lugar em frente à máquina de café.
Uma dragona sobre o rosto da mulher que vinha a conduzir retirava o resto da identidade à senhora. Adivinhava-se no que ficava à mostra da cara a idade, trinta e oito, quarenta e era só isso. A dragona marcava aquela pessoa como quando está nos ombros de um general. Define e ponto. Mas disso elas não deviam saber, disso do cabelo desta loira ter sido cortado nos mesmos moldes dos alfaiates das casas da fardas no século dezoito. Disso elas não deviam saber, disso das franjas com fios de seda e de ouro, iguais na cabeça da condutora , a pender sobre a testa, como nos braços dos militares.
A outra senhora saiu quando o carro parou pela porta do lado direito. Evitou sujar a mão na mangueira com a nota de dez euros enrolada que trazia na mão. Marcou dez euros na tecla para abastecer, e ao abastecer olhou para vários lados, entre eles para mim. Aquela era uma dragona preta. Um franja retinta por cima de dois olhos crispados, de uma testa franzida, de um cú para fora e de uma barriga para dentro. Sim meu general, vou olhar noutro sentido.
Esta noite, Clio não é nome de musa. Disso, elas nada sabem, nem elas nem os dois rapazes que as duas trazem sentados no banco de trás, e eu infelizmente não posso dizer o mesmo sobre o facto de nada saber.
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;)
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