(ainda) Moscovo- Em não tendo como, nem por onde, entender, ver é a solução, mas ver em observando com método e atenção. Acabámos de sair da estação de metro. Acabámos refere-se nós, nós refere-se aos quatro portugueses que somos à procura de uma rua. Rua da qual sabemos detalhes essenciais, mas da qual não sabemos o todo. Sabemos a parte. E saber a parte se não revelou de todo insuficiente. Saber a parte já nos trouxe desde o hotel à estação de Teatralnaya, e da estação de Teatralnaya, logo a seguir ao teatro Bolshoi e após muitas perguntas debaixo do chão, perguntas feitas com um dedo em cima de um mapa-mini do metro, saber a parte acabou por nos fazer chegar à estação Biblioteka Lenina. Esta:
Queremos subir as escadas quando soubermos onde elas estão, as escadas correctas. Oito olhos no mapa, oito olhos nas placas, oito olhos no mapa, oito olhos nas placas, a comparar, a adivinhar e finalmente a desvendar o cirílico. Com maior ou menor engano chegámos ao ponto de encarar a luz do dia que existe para lá das velhas portas de madeira e que brilha nos vidros baços.
Na rua. Voltámos a estar na rua. Somos quatro e temos um mapa, mas somos portugueses e eles são russos. Somos portugueses e queremos ajuda em inglês, mas eles não querem. No meio deste desencontro já não há sequer quem páre para responder ao isco excuse me, please. Old Arbat está perto. O mapa diz que sim só não sabemos onde. Estão perto de nós os capecetes dos pilotos dos caças soviéticos. Estão perto de nós os bivaques, as fardas, o exército e a marinha. O comunismo há-de estar ali ao dobrar das esquina, só não sabemos onde. E é quando nos vem à memória uma frase batida. Uma frase que vem a correr de 2005 para salvar a situação. Uma frase utilizada pelo José Milhazes quando foi preciso chegar de carro a Novogorsk. A frase é a que está no título: извините, пожалуйста. Pronuncia-se mas ou menos assim: izbinit pajouste. E quer dizer: desculpe, por favor. Um senhor russo parou, olhou para o mapa e a falar em russo explicou como chegar à Rua Old Arbat. Eu disse sempre que sim com a cabeça e talvez tenha deixado sair um ou outro да (diz-se dá, quer dizer sim), comunicando com o salvador da nóssia pátria de quatro portugueses sem tirar os olhos dos braços e das mãos do homem. Foi só virar à direita e voltar a virar à direita e lá estava a rua onde vendem as memórias do comunismo.
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7 comentários:
Que bom que fixes estas memórias. Que fixe.
:) very nice way to put it
Duas boas ESTÓRIAS.
A primeira, rica em pormenores e com um "símbolo" Luso, José Milhazes, (qual matéria prima), que, por decisiva e sem ele o imaginar, acabou por ser parte integrante na resolução da pintura impressionista e bem colorida, que o quadro mostra.
A segunda. As memórias do Comunismo.Só assim! Gostei!
Eu tenho as minhas e fiquei a saber, que quatro amigos meus se interessaram em conhecer essas vivências do passado, ocupando assim o pouco tempo livre disponível.
Até fico doente! Sozinha em Moscovo, com comboios para apanhar, metro, taxi... tou lixada! Vou apontar os teus pequenos resquícios de russo acho que vão ser úteis! :)
Jules Rules!!!
vais ver que é tudo mais simples do que parece. Boa viagem Sara
Será mesmo assim tão difícil percorrer as ruas de Moscovo???! Não, só mesmo quando há muita neve e não se vê onde está a rua...
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