14.12.09

As coisas que acontecem

Bem contadas eram em número de sete, as horas, na tarde deste domingo. Nenhuma hora é boa para escutar uma empregada de loja falar sobre futebol e esta, obviamente, também o não foi. Dizia, entre dobras de casacos de malha com botões para homem: "nesta altura do campeonato é bem bom". Ela estava obviamente a falar sobre o preço dos casacos, pese embora o que aquela boca dizia não fosse senão o dizer de uma mulher com ouvido de homem e martelado pela gíria. Em dois segundos decidi-me pelo silêncio. E quando o fiz, foi como se tivesse soprado o apito final numa expansiva, mas inútil conversa sobre modos e senhoras.
Numa outra loja, em dois degraus alongados, a paleta de camisas faz um arco-íris entristecido. Ou é das cores, ou é dos folhos. É certo que quem faz um folho, fá-lo por gosto. Pois faz. Mas as camisas são feias. Horríveis até, porque conseguiram atemorizar certas partes do meu corpo. O pescoço, os braços, o peito, a barriga, os ombros e as costas pediram às pernas para sairem dali o mais depressa possível. Assim foi.
Na rua, passava a haver, naquele certo instante, uma manifestação de homossexuais de todas as idades, acima dos 18 anos, e sexos. Protestavam contra as administrações das lojas por só haver secções para homens e para mulheres. Um moço mais inculto estava a ficar entusiamado sempre que o grito da ordem diza secção. Ao ouvido, um amigo explicou-lhe que era secção e não sexão. O rapaz foi cabisbaixo e partir dali, para ele a marcha já não era uma marcha, era murcha.
Mais à noitinha, o casal de rapazes escolheu para o café, um café-concerto. No palco, o show era um homem e uma viola amarela de madeira. Vieram os acordes e quando veio a primeira estrófe de Porto Côvo, um deles disse ao par uma outra frase sobre o tédio que tinha por aquela música. Teve esta resposta: "a letra podia ser bem pior. Podia começar assim... Roendo uma falange na Rodésia...". À noite, já na cama, um deles amuou por não conseguir ter orgasmos múltiplos. O outro ficou a pensar se para aquilo não havia concerto ou se então não havia conserto. Fosse, como fosse, isso era coisa de mulher. Mesmo aquelas com ouvido de homem.

4 comentários:

Pedro Barreira disse...

mas uma camisa de folhos até que não te ficava mal... :)

António Reis disse...

;) permita-me discordar, meu caro amigo lol abraço

Unknown disse...

"Nenhuma hora é boa para" ir ás compras ao Domingo no mês de Dezembro! Boa recuperação, espero que não precises de internamento para recuperares do trauma... LOL

Abraço

O Faroleiro disse...

Seria caso para afirmar que se pudesse contrair matrimónio, certamente se divorciaria este casal sui generis composto por parte macha e parte fêmeo !

Por outro lado, seria bem pior se um deles tivesse com o período !

Bob Dylan

Aquele bendito instrumento musical, a máquina de escrever, e os seus botões de onanizar tímpanos, as teclas, corpos fora do corpo,...